Embarcações para Pesca Costeira – características e itens necessários à bordo

*Por Gustavo Adelino

Sem maiores pretensões de exaurir o tema ou mesmo de detalhar tecnicamente o assunto, destino o presente texto àqueles que pretendem se lançar ao mar para realizar a pesca costeira, em mar aberto, e que, antes de mais nada, necessariamente vão se utilizar de uma embarcação que deve ser apropriada a este tipo de empreitada.

Para tanto, é preciso dizer inicialmente que um barco para singrar águas marinhas desabrigadas, nas proximidades da costa, não precisa ser de grande porte nem possuir os mais sofisticados equipamentos eletrônicos das grandes lanchas dos mais afortunados. Assim, sem desprezar os quesitos da segurança e das exigências contidas nas normas da Marinha sobre este assunto, tentarei resumir o que deve conter um barco para que se possa pescar com segurança e certo conforto em mar aberto, até no máximo de 20 milhas de distância da costa.

Pra começar, a embarcação pode ser fabricada industrialmente ou artesanalmente, de madeira, ou de fibra de vidro e ter comprimento superior a 5 metros. Pode ser um casco deslocante ou planante. No primeiro caso, a embarcação desenvolverá baixas velocidades e exigirá motor de menor potência, diesel ou gasolina, implicando naturalmente em baixo consumo.

O casco, ainda que construído artesanalmente, deverá ser robusto o suficiente para encarar mares bravios e ondas altas, ou seja, deverá ter costado relativamente alto (acima de 70cm), cavernas reforçadas para resistir aos esforços estruturais causados pelo mar, ter o convés fechado e ser preferivelmente autodenantre, para que toda água que caia no barco, do mar ou da chuva, escorra por gravidade novamente para o mar, não acumulando no interior do casco.

A embarcação deverá ter no mínimo duas bombas de porão acionadas por automáticos e ligadas diretamente na bateria do barco, sem passar pela chave geral. Não se recomenda para mar aberto embarcações com o casco totalmente aberto, como no caso das canoas.

Embarcações de pequeno porte ainda podem ter flutuação positiva, característica essa que mantém o barco flutuando na superfície nos casos remotos de avarias e alagamentos. Para tanto, entre outros recursos, usa-se a espuma de poliuretano expandido entre as cavernas e, nos casos de construções artesanais, pode-se preencher o casco com isopor, garrafas pet, ou mesmo galões de plástico. Pode até não ser visto com bons olhos estes últimos recursos, mas são de grande valia em casos de emergência, especialmente quando se tratar de embarcações de pequeno porte que não permitem o uso de balsas salva-vidas.

Nesse contexto, cumpre destacar ainda as características básicas e fundamentais de um barco para navegar em mar aberto: estabilidade, estaqueidade, manobrabilidade e flutuabilidade. Tais qualidades servem para que o barco, ainda que topando condições de tempo e mar adversos, se mantenha em posição navegável, sem adernar perigosamente, que mantenha as águas fora do casco continuando a flutuar, bem como que continue obedecendo ao comando do piloto com facilidade sem oferecer resistência, ou seja, que seja possível manobrar a embarcação para o rumo que o piloto desejar.

Outro item importantíssimo para uma embarcação de mar aberto é uma cabine habitável, ou seja, algum ambiente que possa abrigar os tripulantes em caso extremo de mau tempo, amparando-os dos ventos, das chuvas e do sol. Apesar disso, se vê muitas embarcações, até de porte médio (7 a 10m), que são apropriadas para mar aberto, mas não têm cabine, porém, na maioria das vezes, são lanchas rápidas que podem se evadir do alto mar rapidamente no caso da chegada de algum temporal. Ainda assim, aconselho uma cabine habitável que comporte todos os passageiros do barco.

Recomenda-se uma motorização dupla, de popa ou de centro, mas se não for possível, que haja além do motor principal, de maior potência, um motor auxiliar de emergência, sendo este de baixa potência, o qual poderá ser fixado numa base própria no espelho de popa ou acondicionado no interior do casco, se este permitir, para ser instalado na popa apenas no caso de necessidade.

Bateria com capacidade (Amperes) suficiente para partida do motor (se for o caso) e para o funcionamento dos eletrônicos, bem como uma boa fonte de energia (alternador), também se fazem indispensáveis, especialmente para o funcionamento do rádio e das bombas de porão, itens vitais do barco.

Sonar, GPS e Rádio

Também são necessárias a luzes de navegação (de topo, de bordos e de alcançado) e ainda para iluminação do convés e cabine para o caso de ser necessário pernoitar em alto mar. As luzes de LED atualmente estão substituindo as lâmpadas incandescentes, com a vantagem incrível de ter baixíssimo consumo e durabilidade indefinida.

Para navegação costeira, as normas da Marinha exigem que se tenha a bordo, além de outros requisitos, um rádio VHF, uma bússula, um refletor de radar (não é radar, mas apenas uma peça de metal que reflete as ondas do radar de barcos maiores), kit de fogos pirotécnicos e salvatagem completa na classe respectiva para mar aberto/costeira. Além disso, embora apenas recomendado pela Marinha, entendo indispensáveis para se ter no barco um sonar para leitura da profundidade e um GPS, de preferência com carta náutica. Atualmente existem aparelhos portáteis de rastreamento por satélite que podem emitir a trajetória do navegador ou mesmo mensagens de socorro/emergência, os quais não são tão caros para a serventia que podem ter. Um rastreador por satélite de uso pessoal com ótimo custo benefício é o SPOT, já vendido no Brasil.

Além dos itens acima discriminados, a embarcação para navegar com segurança em mar aberto depende muito da manutenção preventiva que é dada ao conjunto, barco/motor. Portanto, é recomendável que o próprio comandante da embarcação, normalmente o proprietário habilitado como MESTRE AMADOR, se habitue a conferir se tudo está funcionando corretamente, especialmente a tensão da bateria (acima de 12,4 volts antes da partida do motor – em stand by – e 13,8 a 14,2V quando em funcionamento o alternador), os aparelhos eletrônicos e os relógios indicativos do funcionamento do motor.

Refletor de radar e rastreador por satélite

O casco também deve ser inspecionado com frequência, quase sempre entre uma pescaria e outra, para que se possa confirmar a sua higidez e inexistência de avarias ou fissuras que comprometam a estanqueidade, ocasionando alagamentos e eventual naufrágio.

 O motor, a força do barco, deve ter suas revisões normais em dia, como troca de óleos, dos filtros e verificado especialmente o sistema de refrigeração. Ainda que não se vá pescar com frequência, necessário se faz funcionar o motor ao menos 02 vezes por mês, principalmente se este for movido à gasolina (brasileira), combustível que contém elevado percentual de álcool, altamente danoso ao sistema de alimentação do motor que ocasiona entupimentos dos bicos/carburadores.

As fotos que ilustram a matéria são de uma embarcação (casco de madeira e totalmente laminado) utilizada por mais de 15 anos em minhas pescarias costeiras. Esta “jangada” media 6,20m de comprimento por 2m de boca e estava devidamente registrada na Capitania dos Portos para mar aberto, cumprindo todas as exigências legais para navegação costeira. Em todo esse período naveguei seguramente mais de 10.000 milhas sem que ocorresse nenhum incidente de repercussão ou mesmo alguma avaria em alto mar, seja no motor ou no próprio barco, que me impedisse o retorno ao porto de partida.

Ressalto que as imagens da referida embarcação servem apenas de exemplo para demonstrar que é possível ter um barco de pesca para mar aberto de custo reduzido, sem abrir mão da segurança e que observe as normas da marinha relativamente aos itens obrigatórios que tal embarcação deve portar, quando engajada na navegação costeira.

 

*Gustavo Adelino é guia de pesca Oceânica e homem do mar.


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Sobre o autor

Caco Marinho

Jornalista e apaixonado pela pesca esportiva 
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