Arquivo do Autor

A prática do pesque e solte

Mais que um conceito, um modelo de preservação do nosso hobby

Muitas vezes, nas praias e rios do Nordeste, recebemos olhares de desaprovação e ouvimos palavras de teor impublicável quando capturamos um peixe de bom porte, fotografamos e o devolvemos ao seu habitat. Grande parte dos pescadores locais têm a concepção de que uma boa pescaria equivale a levar o maior número possível de exemplares para casa e é frequente ver o abate de animais fora das medidas regulamentares. Apesar de não concordarmos com isso, entendemos. É uma questão cultural presente não só em nossa região, mas que nem por isso se justifica.

Isso não quer dizer que ninguém deva mais levar peixe pra casa e nem que vamos fazer piquetes em frente às peixarias Brasil a fora. Nada disso. Concordamos que o pescador e sua família devem desfrutar do prazer de saborear um peixe fresco, desde que isso seja feito esporadicamente e de forma consciente. A tabela elaborada pelo IBAMA com o tamanho mínimo de captura para cada espécie de peixe existe por uma razão e os números que constam nela não foram colocados ali aleatoriamente. Cada medida é fruto de estudos e indica o tamanho que o peixe deve ter para conseguir se reproduzir e perpetuar sua existência.

A prática do pesque e solte torna o esporte sustentável e ajuda o meio ambiente a manter o equilíbrio natural. Pensando de forma objetiva, ajuda o próprio pescador, que poderá fisgar mais peixes no futuro em decorrência do aumento da população de pescado. Um exemplo visível do benefício que essa mudança de atitude pode trazer é percebido atualmente com um peixe em particular, o camurupim. Por ter a carne repleta de espinhas o camurupim não é apreciado como alimento e por isso muitos pescadores preferem solta-lo a preparar um prato com o pescado. Isso preservou a espécie e hoje exemplares de todos os tamanhos podem ser encontrados com facilidade.

O objetivo final do pesque e solte é fazer com que o animal sobreviva. Por isso, não basta simplesmente lançar o peixe à água de qualquer maneira. São precisos alguns cuidados para garantir que o bicho que nos traz tanta alegria volte nas melhores condições possíveis ao seu habitat. Com esse intuito, vale a pena ter em mente alguns procedimentos que melhoram o índice de sobrevida do pescado e ajudam o peixe a permanecer saudável.

  • Primeiro de tudo, evite passar muito tempo com o peixe fora d’água. Algumas espécies toleram um tempo significativo fora de seu ambiente, mas a maioria das espécies são bastante sensíveis à retirada de seu meio.
  • Evite pegar no peixe demasiadamente. As escamas são recobertas por um muco que o protege contra infecções. Quando tocamos demais no peixe essa cobertura é retirada e o deixa suscetível a fungos e bactérias. Um alicate de contenção, daqueles que prendem o peixe pela boca, ajuda nessa operação
  • Cuidado com a retirada do anzol. Quanto menos dano o peixe sofrer, em melhor condição ele voltará ao ser devolvido. A retirada deve ser feita com cuidado especial em áreas próximas às guelras.
  • Oxigene o peixe. Antes de liberá-lo, dedique algum tempo com o animal dentro da água para que ele possa retomar suas forças e voltar a respirar normalmente. Faça movimentos de ir e vir com o peixe submerso para que a água possa fluir pelas guelras facilitando a entrada do oxigênio.

Ademais, nada se compara a ver nosso troféu nadando tranquilamente após ser solto. A sensação de comunhão com a natureza e a paz de espírito que a medida proporciona é indescritível. Pesque, fotografe e solte. Pratique está ideia.

Esportividade no quintal de casa

Paixão pela pesca do camurupim faz pescador construir lago para o torpedo prateado

Por Roberto Menks


No Maranhão pescamos o Camurupim – também conhecido como Pema ou Tarpon (Megalops atlanticus) – há muitos anos. Esse tempo seria suficiente para um pescador esportivo se familiarizar e obter o conhecimento necessário, até com riqueza de detalhes, sobre o comportamento de qualquer espécime. Mas com o Camurupim é diferente. Reconhecidamente um peixe astuto, perspicaz é difícil de ser capturado, porque sua boca óssea impede, na maioria das vezes, uma fisgada certeira e seus saltos magníficos tornam ainda mais complicado manter o peixe na linha. O Camurupim é considerado um troféu entre pescadores esportivos do mundo todo, mas pouco se sabe, principalmente no Brasil, sobre sua biologia, reprodução, embriologia e hábitos alimentares.

Por conta disso e, por extensão, pelo fascínio que esse espetacular predador exerce sobre nós, dediquei muito tempo ao estudo e observações comportamentais do “rei prateado” através das pescarias em diferentes estruturas, inclusive na criação em cativeiro. Para tanto, a exemplo de muitos pescadores do litoral maranhense, decidi ter no “quintal” alguns exemplares. O projeto era antigo e alimentava um sonho que nasceu quando conheci várias criações desse peixe em tanques escavados nos fundo das casas e mantidos, alguns em água salobra e outros em água totalmente doce.

Após a aquisição do terreno construímos um açude de aproximadamente 800 m2, não muito profundo, povoado por alevinos de tilápias, carás e piabas adultas em condições de procriação. Esses forrageiros, pós um ano, alimentados periodicamente com ração, chegaram ao limite da capacidade do reservatório. Então era hora da transferência dos tarpons juvenis que estavam se adaptando à água doce no tanque primário onde permaneceram por aproximadamente 8 meses. Pesavam em média 1,0 a 1,20 kg e entre 35/40 cm.

Em abril de 2008 procedemos à transferência do tanque de adaptação para o açude definitivo, cerca de 12 km de distância entre si, que foi realizada com a utilização de reservatório utilizando a água ambiente. Os cuidados da soltura foram os mesmos da captura evitando choque térmico o principal fator de mortalidade. De cinqüenta exemplares transferidos tivemos a perda de três após 24 horas da soltura por causas não determinadas

A experiência nos permitiu o monitoramento regular de forma a conhecer mais detalhadamente seu comportamento em cativeiro. Uma experiência interessante foi observamos seus ataques violentos e espetaculares em criação consorciada onde peixes como a piaba, tilápias e carás (forrageiros) quando alimentados com ração acabam, com o movimento frenético na superfície, atraindo, os camurupins até as margens do açude quando revelam todo seu instinto de exímio predador para atacá-los.

Acostumam-se facilmente com a presença de pessoas próximas ao açude e se condicionam à movimentação, em local específico, onde lhes são dada, ao menos duas vezes por semana, um suplemento alimentar de sardinhas, guaraviras, camarão e outros alimentos de origem animal, que atacaram com incrível ferocidade. É possível tomarem-lhe das mãos, uma sardinha segura pela cauda acima da superfície. Contudo, mesmo com esse interessante desempenho de adaptabilidade, não perdem seu instinto de grandes lutadores na hora da fisgada e a sua conhecida habilidade dos saltos e das fugas. A pesca de exemplares em cativeiro acaba tornando mais desafiador visto que, após o primeiro peixe fisgado, há um estresse generalizado e pode levar horas para um novo ataque. Em açudes de grandes dimensões a ação é mais localizada e há, evidentemente, menos estresse.

Dependendo de alguns componentes que possam afetar seu comportamento como condições climáticas (preferem a água mais quente), alimentação abundante, estresse do ambiente, pode-se passar o dia todo sem uma única ação. Em algumas experiências com plugs de superfície, sem garateia, pudemos observar que em algumas circunstâncias perseguem a isca várias vezes e, por longo tempo, sem que, porém, ataquem-na diretamente. Isso um dia após demonstrarem grande voracidade à mesma metodologia. Com o uso de iscas naturais nota-se o aumento dos ataques, contudo não as capturas.

No período de dois anos e nove meses já atingem em média 4 kg e 80 cm. Esporadicamente fazemos algumas capturas para análise biométrica e recentemente atestamos um exemplar de 5 kg com 90 cm. Já nos foi relatado que espécime de 40 kg foram despescado de pequenos tanques onde não tinham disponível abundância de alimentação. Isso denota a incrível resistência a e adaptabilidade deste peixe sensacional.

O fato é que ninguém pode contestar, ter um açude cheio de baby tarpons no quintal é um privilégio. Contemplar sua beleza, seus movimentos, seus ataques radicais e suas habilidades de escapista ou a sua silhueta sinuosa cortando graciosamente a água da superfície, é melhor ainda.

Pesqueiro particular Depois de ler a matéria acima, muita gente deve ter ficado morrendo de vontade de usar aquele terreninho da casa que está desocupado ou aproveitar o final de semana no sitio da família para pescar. Não é difícil aliar o prazer da pesca à comodidade e o conforto da estadia em casa. Basta tomar alguns cuidados para construir seu pesqueiro no próprio quintal. Cada espécie tem necessidades especificas e, no caso do camurupim o lago pode ser relativamente raso. Um reservatório de água com 1,2m a 2m de profundidade acomoda muito bem esse espécime. Quando for povoar o pesqueiro calcule um exemplar para cada 20m² de superfície de água (se o lago tiver 100m² de espelho d’água o correto é colocar 5 camurupins, por exemplo).

Entretanto, antes de sair jogando os torpedos prateados no pequeno açude, é importante introduzir espécies forrageiras, peixes que servirão de alimento para eles durante seu desenvolvimento. O lago deverá conter tilápias, carás, piabas ou outras presas em abundância para que os astros do pesqueiro se alimentem de forma continua. A não ser que exista, em sua região, alguma opção a baixo custo de se obter peixes e crustáceos suficientes para saciar o apetite do predador. O camurupim não é muito exigente quanto à oxigenação da água, mas, mesmo assim, é conveniente ter algum mecanismo de circulação do liquido. Uma pequena bomba de sucção pode ser usada para construir uma espécie de “cascata” em algum ponto do açude o que melhora a qualidade do ambiente e deixa o pesqueiro mais bonito.

O xaréu surfista

Uma particularidade interessante do Xaréu, e que pode ser observada, sobretudo na praia de Boa Viagem, é o comportamento agressivo na perseguição às presas. Quando o carangídeo enxerga o alimento nada o impede de capturar a refeição. Isso inclui ataques, literalmente, a centímetros dos pés do pescador e corridas em meio às ondas que dão a sensação de ver o peixe surfando nas marolas que se levantam.

Isso rendeu ao peixe o apelido de Xaréu Surfista, fator que torna a pescaria do animal ainda mais atraente. E não só pela plasticidade de ver o peixe cortando as ondas com toda a sua beleza, mas, também, por tornar possível visualizar toda a cena de sua captura. Quando o “surfista” parte em direção a isca podemos ver, como em um filme, o sprint inicial, o encalço à isca, o ataque e a boca se abrindo para engolir violentamente o engodo usado pelo pescador. Realmente uma experiência imperdível para quem gosta de uma boa briga. No bom sentido, é claro.

Facebook
Twitter
Instagram